Seis e alguma coisa da manhã é um horário maravilhoso pra lavar a louça, filosofar, tomar café, dar comida pros gatos ou fazer tudo isso ao mesmo tempo. Eu, como todo ser atrapalhado, tenho uma capacidade de foco que deixa qualquer tecpix com inveja e por isso resolvi que filosofar e lavar a louça era o máximo de coisas que eu daria conta de fazer ao mesmo tempo de maneira segura. Logo, coloquei meu avental, peguei minhas luvinhas de borracha, uma esponja macia, o detergente de maçã e... Porra nenhuma, eu enfiei a mão na pia cheia de louça e sai limpando aquilo com cuspe, sabão de barra - que aqui no MS a gente faz com sebo de onça - e minha barba... Até porque pouca coisa lava uma louça melhor do que a minha barba.
Entre uma esfregada na louça e outra eu me pus a filosofar sobre o universo, a vida e todo esse resto de coisas que a gente acaba filosofando quando resolve filosofar e cheguei a uma conclusão de que, independentemente do que eu faça, eu irei em linha reta pro inferno. Mesmo não acreditando nessas baboseiras de céu, inferno, purgatório, limbo, nosso lar, marcha pra jesus... No fim, eu vou pro inferno e a explicação é muito simples. Embarquem comigo nessa linda viagem pelos confins do universo filosófico lucaísta e vocês entenderão.
Comecemos pelo começo: Eu estava ali, lavando a louça e me lembrei de um churrasco na casa de um primo meu onde minha mãe falava com minha tia-avó - que é evangélica - sobre a "partícula de Deus", o bóson de Higgs, e lembro dela dizendo que se até os cientistas acreditam em Deus, era muita besteira não acreditar. Afinal de contas, os cientistas estariam tentando provar que Deus existe, não é atoa que eles queriam descobrir a tal partícula de Deus. É claro que se ela fizesse uma pesquisa rápida no google ia descobrir que o nome God Particle vem de Goddamn Particle que na verdade é "Partícula Maldita" porque ela está dando muito trabalho pra ser encontrada, afinal de contas o Higgs propôs sua existência em 1964 e até hoje ainda não conseguiram de fato provar a existência desse negócio e porque caso ela exista, estará em tudo. Assim como Deus que caso exista estará em tudo.
Ok, que que o diálogo cientifico-religioso da minha mãe com minha tia-avó tem a ver com eu não ser salvo né? Calma, pequeno gafanhoto, a gente chega lá. Vamos pra parte dois do pensamento filosófico da louça suja:
O bóson de Higgs, estaria em todo lugar, constituindo toda a matéria certo? Pois é. Enquanto eu lavava a louça eu percebi algo interessante, eu estava em minha casa, no interior do Mato Grosso do Sul, mas tinha um monte de coisas na cozinha - e na sala, no quarto, no banheiro, no cesto de lixo, debaixo da unha dos gatos - que me lembram minha ex e ai eu parei pra pensar que todo mundo passa por isso. Depois de um término ou uma morte ou algum tipo de separação seja ela por excesso de distância ou por falta de tempo, seja ela intencional ou acidental, sempre sobra muito da pessoa em todo lugar. É como se aquela pessoa se tornasse onipresente por um tempo. Meu tio costumava dizer que ele não era muito adepto à essas patifarias de religião, mas acreditava que todo ser humano tinha uma certa carga de energia que ele deixava pelos lugares onde passava, por isso às vezes a gente lembra de alguém e até mesmo sente a pessoa sem que ela esteja ali. Pode ser que sim, pode ser que não, o que importa é que usando a lógica aristotélica básica - e explorando aquele bug que ela tem - podemos chegar a uma conclusão interessante:
O bóson de Higgs está em todo lugar
Minha ex está em todo lugar
Minha ex é o bóson de Higgs.
E foi nesse momento de epifania religiosa, emocional e científica que eu concluí que eu vou diretamente pro inferno sem escala e sem direito a voltar porque seguindo essa mesma linha - bugada - da lógica nós chegamos à seguinte conclusão:
Deus é onipresente.
Minha ex está onipresente.
Minha ex é/está Deus.
Pela regra universal das relações humanas, ex-namorados(as) tendem à indiferença, quando não ao ódio. Reaplicando a lógica aristotélica - bugada - aqui, veremos que Deus está indiferente/odeia a minha pessoa e que Deus odeia o pecado. Seria eu o pecado? E se eu sou o pecado, então... To confuso.
Mas é claro que a gente pode mudar tudo e analisar a coisa de um jeito diferente, usando outras premissas e chegando a uma conclusão um pouco menos apocalíptica, um tanto mais romântica e tão assustadora quanto a primeira.
Minha ex é/está Deus.
Deus é Amor.
Minha ex é Amor...
E é claro também que se a gente continuar seguindo esse padrão, logo logo chegaremos à conclusão de que minha ex é cega, ou que eu sou ex namorado do Ray Charles, ou que eu passei dois anos fodendo o amor ou que sei lá, o diabo me mordeu laiá laiá.
Por isso que eu sempre digo pra não me deixarem lavar a louça de manhã. O sebo de onça do sabão em junção com a minha barba faz com que eu me torne um pensador que deixaria Platão com inveja e faria o Stephen Hawking levantar e aplaudir minhas teorias.